segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

O caso da papinha em Buenos Aires ou o porquê você deve se libertar do excesso de zelo


A primeira vez que viajei com meu filho, ele tinha 11 meses. Até então, ele só havia comido papinha feita com esmero, amor e aquele conhecimento nutricional que as mães de primeira viagem se gabam de possuir. Com legumes ultra orgânicos, folhas hidropônicas minuciosamente selecionadas, quinuas super sônicas e gotas do mais puro azeite extravirgem, as papinhas eram elaboradas seguindo rígidos critérios e controlados padrões de qualidade.
 
Temerosa com a iminência de uma ida a Buenos Aires, preparei vários potinhos com a papinha, congelei-os, coloquei-os em uma bolsa térmica, enfiei a bolsa dentro da mala e segui para o aeroporto, preparando-me para passar pela polícia federal sem demonstrar nenhuma alteração fisionômica. Afinal, não queria correr o risco de implicarem com o conteúdo da mala.
 
Quando cheguei ao hotel, que foi escolhido por ter micro-ondas e frigobar no quarto, abri a mala e vi aqueles lindos potinhos dourados, que eram as papinhas feitas com mandioquinha, e os potinhos acobreados, que eram as de feijão. Uma satisfação imensa tomou conta de mim ao perceber que uma viagem não seria impedimento para uma refeição balanceada e caseira para o meu menino. Mas isso durou pouco. A ideia de levar comida para os primeiros dias até que eu conseguisse descobrir em Buenos Aires o que fazer me fez engolir seco.
 
Depois da ajuda do Google, descobri no bairro de Palermo um restaurante descolado de comida orgânica. Assim, quando as papinhas acabaram, fui até lá munida dos potinhos vazios na esperança de encontrar algo que as substituísse à altura. O chef do restaurante mostrou-se muito compreensivo e, após algumas trocas de palavras, disse que enquanto eu almoçava, ele iria assumir o desafio de preparar as papinhas, utilizando não só todo o arsenal natureba, que era a proposta do restaurante, mas também os conhecimentos adquiridos na escola de culinária Le Cordon Bleu. Das mãos desse chef saíram papinhas gourmet: papinha de ratatouille com molho reduzido de aspargos, papinha de abóbora com tomate confit e uma outra que eu não sei como nomeá-la, só sei que tinha um quê de indiano, alguma coisa a ver com masala.
 
Empolgada, quis que meu filho experimentasse todas. A cada rejeição, via a minha felicidade rolar morro abaixo. Achei que talvez fosse o movimento do lugar, o cansaço, o sono, a hora. Voltei para o hotel e nada dele querer comê-las. Evidentemente eu havia experimentado cada uma e gostado muito do sabor delas, mas ele só fazia caretas e cuspia tudo, sem dó nem piedade.
 
Depois de inúmeras tentativas frustradas, preocupada com a saúde do garoto que não comia, apelei. Saí em busca de suco de laranja, empanadas e papinha pronta de farmácia. Ele comeu tudo e ficou satisfeitíssimo. Dormiu a noite inteira. Eu também fiquei assim depois de saborear as papinhas gourmet acompanhadas por um bom vinho argentino.

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